Nunca pensei em me tornar uma atriz, e muito menos era fã de novela quando mais nova. Nunca me atentei a detalhes como nomes de atores, personagens ou enredo barato de filme da sessão da tarde. Eu, que desde menina era apaixonada pelos números, me vi rainha em um terreno dominado por príncipes. A engenharia era minha vida desde sempre! Eu amava cada parte e cada cálculo daquela loucura que eu chamava de minha.
Até você aparecer.
Nunca pensei em me tornar uma atriz e te garanto que nunca foi encenado com você. Nada foi decorado, nenhuma declaração premeditada, nenhuma troca de olhares ensaiada. Quando me esbarrei contigo na escada, aquilo foi só uma gracinha do acaso. A matemática até poderia explicar as probabilidades da gente se esbarrar naquela escada, naquele dia e naquele semestre, mas eu dispensei os números e me apeguei ao clichê: destino. Era gostoso imaginar isso, eu devo admitir.
Nunca pensei em me tornar uma atriz, mas você parecia empenhado a me fazer conhecer um universo ilusório e cheio de máscaras. Um universo em que pessoas assumiam outros papéis e não se importavam com os demais, afinal, era só mais um teatro. Só mais uma temporada. Nunca pensei em me tornar uma atriz, mas tirei meu diploma da pior forma possível: mentindo para os outros. Enganando a saudade, ensaiando discursos batidos de como te esqueci e recitando músicas de foça como em um musical caído. A verdade é que eu merecia o Oscar pela indicação de pior fora do ano, mas provavelmente ganharia o de melhor atriz pela cara de superioridade que eu aprendi a fazer quando cruzava os corredores até aquela maldita escada onde te conheci.
Nunca pensei em me tornar uma atriz, e hoje sigo atuando em meu papel de desapegada que te esqueceu. Nem me lembro quando isso começou, mas confesso que o papel me cansa. A entrega é dura e cruel e bem mau remunerada. Continuo atuando para um palco vazio, sem platéia. Nosso amor nos deixou no escuro, e o público se foi. Resolvi fechar as cortinas e encerrar esse amor, o tema já saiu de moda.