O ritmo corrido de estudo e de vida tem me feito deixar os escritos para depois, o que acaba acarretando uma sobrecarga de criatividade e uma dose extra de frustração por não conseguir passar tudo pro papel. Por conta disso, até as pequenas coisas tem sido de extrema novidade e surpresa para mim. Há dois dias, juro que vi uma árvore em uma praça que parecia um soldado romano com pés de galinha segurando um estandarte. Na volta para casa, uma planta alta parecia um leão com juba verde. Achei graça disso, enquanto estava no ônibus; para quem tem uma mente fértil, tudo é começo de história ou liga para criação. E como eu disse, não tenho tido muita oportunidade de gerar tais escritos, mas hoje a vontade tornou-se quase incontrolável.
Bauman falou sobre tempos líquidos, onde nada dura e tudo é muito superficial. Não sei dizer se concordo ou não, mas aprendemos ao longo da história que sempre haverá gregos e troianos. Mesmo que existam aquelas pessoas superficiais, em contrapartida haverá uma leva de pessoas profundas e amorosas. Do mesmo modo como há trevas e luz dentro de cada pessoa, também há a superficialidade e a profundidade. E nenhuma das duas é de todo ruim. O meio termo é bom, o equilíbrio faz bem e eu já nem sei se esse papo tá fazendo sentido. Tô falando disso porque a superficialidade e a profundidade é o que dá início ao sentir, é por aqui que você decide o que dá liga ou não. É agora que você escolhe se molha só o pé ou o corpo todo. Bauman pode até acreditar que nada dura, e se ele tiver certo, nem mesmo a superficialidade dura; a profundidade uma hora vem. E sentir é tão bom. É como encarar a árvore na praça e achar que ela é um soldado grego com pernas de galinhas. Ou então, ver alguém no ponto de ônibus e sorrir porque ela está falando sozinha, e você fala sozinha. Mês passado mesmo eu vi um cara conversando com potes de macarrão instantâneo e não consegui não sorrir. Eu falo com minhas plantas. Cada um tem a turma que escolhe, né?
O fato é, isso aqui nem é um texto ou crônica ou carta, é só um desabafo. É só um prólogo para o que é a história da minha vida e das coisas que eu descubro no dia a dia. Como o modo que eu cruzo a perna esquerda por cima da direita sempre ou sempre rezo para Deus como se ele fosse “querida” e não “querido”, porque li em um livro aos oito anos que “querida” a gente usa para quem a gente quer bem. Do mesmo modo que vó tem um monte de costume, que sua tia chata também é cheia dos tique e seu amigo do cursinho é sistemático e não pisa em azuleijo preto ou cinza. A oportunidade de ser superficial ou profundo me faz pensar a cada dia o quão incrível é sentir. Desde um sentimento genuíno por alguém que está longe como a felicidade de sentir o cheiro de pão de cebola fresquinho na padaria. Ou o perfume de alguém ou ao orgulho de si próprio por conquistar algo importante. Aprenda a olhar para os dois lados e aceitar. E sentir. Tem graça e sentido e tudo, basta você enxergar.