Faz muito tempo desde que a gente se encontrou naquela padaria e conversamos sobre amenidades, enquanto a fila caminhava lenta em direção ao caixa. Se eu tivesse saído dois minutos atrasada eu não teria pego o ônibus certo, e não chegaria a tempo de te pegar escolhendo maçãs em frente ao freezer. O susto inicial passou rápido uma vez que minha fome era maior e eu precisava de um pão de queijo. Pão de queijo e chá gelado. Você não deixou de notar. Fez questão de fazer uma gracinha sobre minha mania idiota de tomar chá gelado, já que ninguém mais toma chá gelado. Eu te ajudei com as maçãs e você segurou minha bolsa, enquanto eu escolhia os pães de queijo certos. Aposto que para os olhares curiosos da padaria, nós éramos o típico casal comum e amoroso. Não precisávamos conversar para estarmos exatamente nos comunicamos. E foi na fila que eu percebi isso. Eu entreguei sua sacolas de maçãs e você colocou minha bolsa no meu ombro e puxou o zíper de uma vez. Eu enfiei a mão na bolsa, puxei a carteira e antes que eu perguntasse o valor, você já estava colando tudo na sacola. A atendente até sorriu da sua gentileza e eu tive que ri da sua pressa em me despachar. Paguei meu pão de queijo e chá gelado e nem percebi que parei na porta da padaria pra te esperar. A gente falou da semana, de como tudo andava corrido e como nossos amigos viviam suas vidas e seus relacionamentos e mesmo depois de tanto tempo, a gente ainda tava lá… na mesma de sempre. Não que a mesma de sempre seja ruim, mas é só a mesma de sempre. É sempre eu com meu chá gelado e pão de queijo, e ele com a dieta fitness. Dá até vontade de chorar quando me lembro que durante alguns anos eu segui essa dieta fitness.
E eu odiava a dieta fitness, mas gostava de estar com ele.
Quando cheguei em casa, me dei conta de que mesmo que tudo tivesse acabado e tivéssemos seguido nossas vidas, a gente tinha essa ligação. A gente ainda tinha um mapa que sempre levava um ao outro, tanto fisicamente quanto emocionalmente. E apesar disso ser poético, eu não acho que seja bacana. E nem acho que seja bom sinal. Nos rompemos por inúmeros motivos dolorosos, e embora eu me lembre de amar você por muito tempo depois do fim, o desfecho era necessário. O fim chegou como uma gentileza magnânima e eu aprendi a conviver com sua ausência – assim como sei que você arrumou artifícios para não sentir a minha. E tudo bem. Seguimos em frente.
Mas hoje, ainda com o encontro da padaria em mente e lembrando de todos os outros que houveram antes – em que seus dedos se entrelaçaram nos meus ou você me cedeu seu casaco para que eu pegasse sereno – eu percebo que isso tem que acabar. Eu nem sei se você ainda se importa, mas tem que acabar. Assim como encerramos nossa história como um enredo ruim que não vende mais exemplares, precisamos queimar o mapa que nos leva um ao outro. A gente tem que parar de sorrir um pro outro na padaria ou ajudar a contar o troco. Eu não posso mais perder o ar ao te ver escolhendo maçãs, e nem quero que você sorria ao me ver tomando chá gelado porque não tem nada de gracioso em quem toma chá gelado! Isso precisa acabar.
Não sei se me resta pedir algo, ou até exigir.. quem sabe. Depois de tudo, sinto que mereço paz e leveza; mesmo que eu goste de te encontrar de vez em quando, ou ache gracioso o quanto você não sabe escolher frutas ou verduras. Apesar da forma familiar como lidamos um com o outro, nós não podemos mais. E nem queremos – você sabe que não. O calor acalentador que invade nossos corações é só um alerta do que poderia ter sido daquilo que não foi. E eu não quero sentir isso mais. E nem você.
Então por favor, querido, isso tem que acabar.