Não gosto de ficar remexendo coisas acabadas, mas não posso me calar também diante da sua descrença palpável. Sua falta de fé no que já foi e no que existiu ao longo da vida me causa um aperto no coração sem fim. Eu sei que ele errou, eu sei que você escolheu partir por conta disso, mas não sabemos a verdade. Querida, acredito que nunca saberemos. Apesar de eu acreditar que você está melhor sozinha, ele pode estar olhando suas fotos naquele porta-retrato em cima da mesa do computador dele neste exato momento.

Não estou falando isso para te chatear ou remoer coisas batidas, mas sua falta de fé incomoda e preciso opinar. Ele pode sim estar olhando a foto de vocês agora, por que não, não é mesmo? Não sabemos, mas ele pode. Muito tempo se passou e como grande parte das coisas na vida, os detalhes se perderam em meio a mesmice e mesmo que você o odeie, ele pode estar com saudades. Pode ser que ele faça as mesmas coisas que você faz escondida se lembrando de vocês dois, sem deixar rastro nem pistas para que alguém tenha a confirmação, porque suspeitas, as pessoas já tem. Talvez, ele passe a mão naquela barba mal feita dele e sinta saudades do quanto você gostava. Ou percorra caminhos que eram teus, vista aquela camisa que você adorava, releia os registros ou olhe para o sofá no lugar onde você costumava sentar, na tentativa incansável e falha de não deixar que você se disperse das lembranças quebradas da memória ruim dele. As boas lembranças, é claro – as ruins já nem importam mais. Aposto que ele se pergunta se um dia importaram realmente.

Eu sei que aperta o coração, mas respira fundo e continua. Apesar disso ser uma possibilidade de não acontecer, também existe a possibilidade de acontecer. Por escolha ou fatalidade – pouco importa a essa altura – ele pode pensar em você do mesmo modo que você pensa nele, todos os dias, aliás. E, ainda assim, morrendo por dentro, ele pode preferir o silêncio – assim como você prefere a mágoa, depois de tudo. Ele pode reler seus bilhetes, procurar o teu cheiro em outras garotas, procuras as mensagens perdidas na caixa de entrada e de saída do celular, e ansiar loucamente para que alguma chegue. Ele pode ouvir as suas músicas – aquelas que você fez ele ouvir – procurar a tua voz em outras vozes, perceber algum traço imaginário seu em alguma pessoa ou sonhar contigo todas as noites, e acordar desesperado pela saudade. A saudade não mata querida, ela tortura. E se a gente ama de verdade, e a tortura é o que resta da pessoa em nossas vidas, a gente aceita tranquilo e resignado.

Quem nos faz falta, acerta o coração como um vento súbito que entra pela janela aberta. Não há saída, desvio ou retorno. Talvez, ele perceba que você faz falta e diferença e de alguma forma, numa noite fria, essa falta se multiplique devido a ausência de um corpo quente ao lado dele. Você não sabe, nós não sabemos. Ele pode ser o cara com quem você passará aquelas tão sonhadas férias na Grécia, ou vai dormir abraçada com ele enquanto pega no sono vendo aquele documentário em alemão. Talvez ele volte, talvez não. Pra qualquer uma das opções, só depende dele. E embora você se repita que ele não é torturado pela saudade, nós não sabemos. Pelo menos, não de verdade.