Garçom, por favor, leva essa merda daqui. Traz cerveja, por favor. Ah, não tem? Então traz cachaça, tequila, whisky, não importa – só leva essa merda daqui. Tira esse champanhe da minha frente. Isso deveria ser considerado bebida do diabo, feitiço para abrir corpo fechado e levar a gente a confessar os pecados. Leva essa merda daqui porque esse cheiro adocicado me lembra uma pessoa.. e olha aí, nem tomei e já estou abrindo a boca. Leva isso daqui e traz uma coisa mais forte. E que não me lembre aquele filho da mãe… olha eu falando de novo!

Não, não, não. Não insiste, não coloca isso na mesa. Olha.. tudo bem, só um gole talvez. Não, não. Leva essa merda daqui. Esse champanhe de gosto leve me lembra um casamento à beira mar em que eu fui acompanhada daquele com quem eu achei que dividirias as coisas boas da vida – e cá entre nós, ainda acho. Mas eu não quero lembrar. Foi culpa do champanhe, sabia? A briga, a traição, o fim. O barraco foi armado da pior forma possível, e ele cheirava a champanhe. Já eu.. segurava a taça com força, já mais embalada pelo a bebida do diabo do que pela minha raiva real. Leva essa merda daqui e traz cachaça. Ou traz catuaba. Já ouviu falar em suco gume, moço? Pode trazer. Tô bebendo própolis com limão, mas não tomo dessa garrafa.

Não dá esse sorriso, não ri da minha indignação. Eu tenho motivos para odiar minhas lembranças e minhas diretrizes à respeito dessa bebida. Leva essa merda daqui e traz qualquer outra coisa que não me lembre vexame em casamento, fim de relacionamento e o finado em questão. Eu nunca gostei de tomar champanhe, e jurei que se fosse preciso só o tomaria em meu casamento. Casamento esse que acabou bem antes de se quer começar, e me trouxe uma ressaca fodida, três dedos quebrados e um coração partido. Leva essa merda daqui por favor, e traz aquele moço sentado no bar de terno cinza que está sorrindo para cá; ele eu ainda preciso encarar. Dele eu não consigo fugir.