Quem mandou você sair atrasado para aquela aula e mais ainda, deixar a chave comigo e a senha do notebook anotada em cima da mesa? Quem mandou você me deixar muito a vontade e me fazer sentir como se cada pedaçinho desse apê fosse um pouco meu também? Ah, menino… quem mandou? Quem mandou você me fazer desistir de ir pra aula de francês me prometendo colo e carinho? Quem mandou abrir um espaço no guarda-roupa para eu guardar minhas coisas enquanto eu passo meus dias aqui? Quem mandou?
Eu sei que a gente custou a se entender, e eu custei a me sentir a vontade de verdade, e tudo bem. Hoje está tudo bem. E a prova disso, amor, é que eu tô escrevendo deitada na tua cama, usando tua internet e comendo do seu biscoito porque você não chegou até agora e eu tô com fome. E eu sei que você provavelmente falaria para eu comer outra coisa; fazer uma tapioca, comer um misto ou até me aventurar a desbravar sua cozinha e fazer um macarrão. E não seria má ideia, afinal eu tô com fome, mas tô com mais preguiça. Então eu tô aqui, rolando na sua cama, com as coxas de fora e usando uma blusa sua amassada enquanto te escrevo versos. Porque eu tô em casa.
E eu não sei quem mandou você insistir em ir para essa aula chata, sendo que você tá mandando mensagem dizendo que se arrependeu de pegar o ônibus, já que meu cheiro é melhor e mais acalentador do que o cheiro de formol da aula de anatomia. Eu sei disso. Eu te avisei disso, mas você não ouviu. Enquanto isso eu tô aqui na sua casa, deitada na sua cama, e sentindo o cheiro do nosso sexo que insiste em ficar nos lençóis. Isso até me arranca sorrisos maldosos, ao pensar que tais lembranças te atormentam quando você dorme sozinho. Sei disso porque tua ausência me atormenta também. Mas não hoje, amor, porque hoje eu tô em casa.
E tudo bem se você quiser demorar aí na aula. O barulho do ventilador me acalma, seu colchão é confortável e eu provavelmente vou desbravar sua cozinha e deixar toda a louça para você lavar. Não me importa a hora que você chegar, porque sei que vou estar aqui – ainda de coxas de fora e cabelo solto. Mas com certeza ainda deitada na tua cama – porque tua cama cheira à você.