Ei, encontrei sua carta.

Acho que a sua intenção nunca foi de que ela chegasse até mim, de fato, porque você nunca a enviou. Mas lá estava ela, perdida por entre as caixas da mudança em que separamos nossas vidas no último ano. Eu estive meio preguiçosa desde que tudo acabou, e tais coisas ficaram para trás - ou melhor, de lado. Caídas em cantos, amontoadas no escuro. Foi semana passada que tive tempo, ânimo e coragem para revisitar tudo e acabei encontrando-a.

No primeiro momento, eu não a reconheci, mas sabia que não era minha. Digo, que não era uma carta escrita por mim: como você bem sabe, eu sempre uso envelopes roxos e aquele em questão era branco: comum, discreto, frio. Não era meu, eu tinha certeza. Qualquer pessoa que me conhece poderia dizer com clareza.

Depois de considerações internas rápidas, decidi abri. Me sentei por entre as caixas, certa do que me aguardava. Quando abri, a caligrafia cursiva e curvada logo me trouxe você. Desabafos e confissões dolorosas sobre o que sentia teu coração e o que decidia sua mente depois que o vendaval passou. Não foi fácil ler nem relembrar. Você parecia estar escrevendo à mão com muita raiva, mágoa e tesão. Decididamente assim como te escrevo agora.

Tive que tomar ar para continuar lendo, e mais ainda para voltar a te escrever como te escrevo agora. Você, que nesta carta me escreveu com tanta raiva e tesão, me relembrou momentos em que eu mesma te escrevi da mesma forma.

Foi triste, eu devo imaginar. Foi pesado, como você pode sentir. Mas hoje é passado. Você, eu, nós, as caixas da nossa história e a carta, que hoje recebe esta resposta; envelope roxo, considerações justas e claras. Mágoa, tesão, raiva, tudo o que há direito, mas sem volta. Sem retorno. O fim foi a melhor conclusão, o melhor desfecho e indubitavelmente, o melhor final.

Adeus.