Ele era bonito igual um tiro. Daqueles que machuca quando vai embora, que faz sangrar qualquer mulher quando ele anuncia a partida. Ele era incrível e caricato, de personalidade forte e humor leve. Todo conversado, mas sem espaço para se aprumar. Vivia em seu próprio mundo, seguindo apenas suas diretrizes. Na festa, quando o conheci, ele estava entretido com a música sertaneja e a cerveja gelada. Cantava para si próprio, alheio aos flertes e olhares das mulheres a sua volta. Não trocamos mais do que duas frases, mas também não precisamos; ele só queria saber de beber e cantar.

Apesar da eminencia da incompatibilidade, me chamou atenção conhecer alguém tão ocupado em ser apenas o que ele é. Sem ter que impressionar, sem ter que pagar de gostoso e requisitado – por que meu Deus, ele é; gostoso, requisitado, bonito igual um tiro. Eu até tive que me controlar para não cair nas graças daquele conjunto sorriso e barba, voz grave e um metro e oitenta. Até cantando ele era sexy e leve. Não aquela coisa sexual e desesperada, mas aquela sensação de imensidão e intensidade. Ele ria mais para si próprio do que das piadas bêbadas que estávamos cantando. Quando resolveu entrar na brincadeira, assumiu sem pudor os crimes que cometera apaixonado.

Demorou um tempo para eu me dar conta que da mesma forma como ele chamava a atenção, ele não dava, ou oferecia. A vida dele parecia estar fechada para visitação, então toda e qualquer interação era composta por uma fina película de segurança que evitava a profundidade. Me incomodou, a principio. Depois eu deixei para lá. Mas as coisas mudaram a partir daquele dia, precisamos de alguns meses, é claro, e também muita cerveja até que eu pudesse ver o outro lado daquela composição toda; ele se aproximou do nada, em um domingo, me servindo um copo de cerveja e perguntando da tatuagem de caligrafia fina que eu tinha no colo. Eu fiquei surpresa, achando graça, mas os olhos dele brilhavam de uma forma discreta como quem ansiava que uma porta fosse aberta. Foi só depois de quatro copos que eu percebi que não se tratava de abrir uma porta e sim de entrar. Ele estava me convidando, e confesso que pensei mais de duas vezes, mas entrei.

E entrei sem volta.