Ele era incrível, você se lembra? Tão alto, forte, o sorriso imenso e os olhos azuis. Ela também era linda. Pequena, delicada e loira. Me lembro dos dois na faculdade. Ele era de família rica, o carro e o relógio entregavam facilmente a diferença de classe entre os dois. Já ela, eu conhecia da academia. Os dois eram lindos, tão amorosos. Por isso estranhei quando ela mudou de sala. Não comentei, não era da minha conta. Mas ela foi ficando mais agitada, mais fechada, parecia estar tentando fugir de algo.
Semanas depois eu o encontrei aos beijos com outra em um dos blocos da faculdade, e entendi. Eles haviam terminado e ela se afastou para não sofrer. Fez sentido, afinal, mas depois lá estavam eles juntos outra vez. Aquela história de que quando a gente gosta, né. Os dois pareciam bem, apesar de tudo. Sempre juntos, embora ela não parecesse mais feliz e os olhos claros deles parecessem mais frios do que eu jamais tivera visto antes.
Depois de um tempo, tudo se revelou. Ela havia ficado grávida. Não ligava de ter o bebê sozinha, mas ele não queria se envolver. Ela tentou se afastar, mas ele foi atrás. Ela resistiu até onde deu, mas ele era bom de lábia, dava para perceber. Me pergunto se eu teria feito diferença se tivesse perguntado a ela o que estava acontecendo. Me pergunto se ela pediu ajuda para alguém em algum momento, ou se choque de todo mundo foi mesmo de surpresa ou culpa. Semana que vem faz dois anos que ela morreu na mesa de aborto.