Faz uma semana que encaro o tampo da mesa, observando a fumaça sair do café. Há quem diga que o silêncio é deprimente, mas para mim é libertador. No entanto, preciso assumir que o silêncio tem me incomodado. Já faz uma semana que você saiu porta afora, depois de uma longa temporada por entre os cômodos desse meu apartamento, que mais foi nosso nesse tempo a dois. Tento não chorar pelas coisas, venho de família russa, mas está difícil aguentar a saudade. Assim como meu café nessa manhã, por favor, amor, não nos deixe esfriar.
A vida tá boa sem você, mas sei que juntos somos melhores. Você mesmo sabe disso, e confessa à cada postal que me manda. Não ouso pedir que abandone teus sonhos ou volta para essa casa que já foi nossa, mas não posso negar que sua ausência tem mudado a dinâmica e me feito ficar... quieta demais. Não no bom sentido. Não daquela forma que eu costumava ficar, aprumada em seus braços, com meu lençol cobrindo até a cintura - porque sou calorenta demais. O silêncio de agora é meio agourento, como aquele clima que antecede uma grande tempestade. Eu sei que o que está por vir é bom, mas vai ser pesado. Assumir que me apaixonei durante nossos meses juntos vai ser foda, ainda mais longe de você.
E bom, eu sei que eu mesmo catei a fita de dizer que era temporário, casual, que não ia dar em nada. Afinal, você é cidadão do mundo e eu estou submersa demais nessa minha caminhada pela medicina. Nós dois sempre soubemos disso. Embora você me comprasse canecas, efeitasse meu apartamento e se referisse a minha casa como "a nossa casa", a gente sempre soube que acabaria. Uma hora ou outra, sua passagem bateria na porta e você partiria pelo o mundo como o sempre fez. Eu ficaria aqui, com meus livros e minhas histórias, traçando minha caminhada sozinha. Era um bom plano. Nos apaixonarmos, eu diria, era baixa probabilidade. Mas baixa probabilidade de acontecer, acontece. E quem diria, ganhei na megasena.
Não há muito o que fazer agora. A tempestade está a caminho. Em alguma dessas madrugadas qualquer, em que passo acordada escrevendo e tomando vinho, vou me olhar no espelho e confessar a mim mesma que eu tô sentindo mesmo sua falta, que tá difícil aguentar e o pior... que o tempo tá passando. Você está no outro lado do mundo agora, distante demais de sentir de perto minhas considerações, mas se posso pedir algo nesse postal, é que por favor amor, não nos deixe esfriar. Volte enquanto é tempo. Volte enquanto ainda temos tempo. Não deixe a tempestade passar.